24 Janeiro 2022 SINOPSE

Tratamento da vertigem depende da causa

Tratamento da vertigem depende da causa

A vertigem é um sintoma que pode ocorrer em diversas patologias vestibulares (perturbações do equilíbrio), pelo que, antes de tudo, é importante perceber a sua causa. No 10.º episódio da websérie SINOPSE, a Dr.ª Diana Melancia (interna de Neurologia no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central) entrevista o Prof. João Lemos (neurologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra), que explica os sintomas de vertigem, as principais causas, como se processa o diagnóstico e que opções de tratamento existem. 

O neurologista João Lemos começa por distinguir a vertigem de outros termos relacionados com as perturbações do equilíbrio, como as tonturas, sintoma mais vago e menos específico. A vertigem, por sua vez, “está muitas vezes associada à presença de uma doença vestibular, sendo que a queixa mais frequente de quem experiencia este sintoma é a sensação de ver o mundo a andar à roda, ou seja, a sensação de que o ambiente envolvente ou o corpo estão em movimento, quando, na realidade, não estão”. 

Embora a descrição desta experiência seja muito variável, João Lemos salienta a importância de estandardizar a sua definição, sendo que, “atualmente, o mais consensual é dizer-se que a vertigem é uma ilusão do movimento”.

 

 

Principais causas

A vertigem paroxística posicional benigna (VPPB) é uma das causas mais comuns de vertigem e relaciona-se com a posição anómala dos otólitos (cristais de carbonato de cálcio localizados nos canais do ouvido), que se aglomeram em determinada zona, desencadeando vertigem. “Tipicamente, nestes casos, a vertigem ocorre quando a pessoa muda a posição da cabeça (posicional), como quando se deita, olha para cima ou para baixo, provocando uma sensação de vertigem que dura alguns segundos ou minutos”, esclarece João Lemos. 

A enxaqueca é também uma das principais causas de vertigem, talvez mesmo a mais prevalente a nível mundial. Nestes casos, “pode ou não ocorrer dor de cabeça durante os episódios de vertigem, que podem ser recorrentes – o doente queixa-se de ver tudo a andar à roda e os episódios de vertigem podem ser espontâneos ou induzidos pela mudança de posição da cabeça (tal como na VPPB)”, afirma o neurologista. 

Embora menos frequente, a nevrite vestibular também é uma causa de vertigem. Trata-se de uma inflamação do nervo vestibular, a estrutura nervosa responsável pelo equilíbrio e por transmitir a informação sobre a posição da cabeça ao cérebro. “Regra geral, a nevrite vestibular só ocorre uma vez na vida, mas tem um alto impacto na pessoa que a experiência, com uma vertigem muito agressiva e acompanhada de enjoo ou vómito, podendo durar semanas até que a pessoa consiga recuperar o equilíbrio”, indica João Lemos. 

A vertigem pode também ser sintoma de um acidente vascular cerebral (AVC) ou decorrer da presença de doenças inflamatórias do sistema nervoso central, como é o caso da esclerose múltipla.

Diagnóstico

Na maioria dos casos, o diagnóstico de vertigem realiza-se através do exame clínico. Ou seja, “raramente é necessário um meio complementar de diagnóstico para identificar a causa da vertigem”, que, segundo explica João Lemos, “pode ser identificada através de um exame vestibular e neurológico cuidado”. 

“É muito importante fazermos uma observação direta dos movimentos oculares, de forma a detetar a presença de nistagmo (movimento involuntário dos olhos). De acordo com as características e os sinais associados ao nistagmo, podemos não só confirmar que a vertigem se deve à presença de uma doença vestibular, como também diagnosticar corretamente a doença em causa (dentro das mais prevalentes, VPPB, enxaqueca vestibular, nevrite vestibular ou AVC)”, refere o neurologista.  

Tratamento

Segundo João Lemos, antes de tudo, é essencial que o médico informe o doente sobre o seu problema, com o maior rigor possível. “Uma das principais angústias da pessoa que sofre de vertigem (além da experiência que, por si só, pode ser drástica) é não saber o que está a causar esse sintoma. Ocasionalmente, os doentes atribuem a vertigem a causas erradas, como doenças do fígado ou ansiedade”, sublinha. 

Quanto ao tratamento específico da vertigem, no caso da VPPB, a abordagem passa pela realização de manobras que possibilitam a eliminação eficaz dos otólitos acumulados anomalamente em determinada zona do ouvido. “Na maior parte dos casos, o sucesso é imediato e, nos dias seguintes à intervenção, a vertigem já será mínima”, nota João Lemos. 

Já no caso da vertigem causada por enxaqueca, “aplica-se um tratamento farmacológico preventivo de próximas crises, que é discutido com o doente”. Quando a causa da vertigem é uma inflamação do nervo vestibular, “pode-se prescrever anti-inflamatórios, como os corticoides, que permitem encurtar o tempo dos sintomas”. Já nos casos de AVC e doenças inflamatórias do sistema nervoso central, “normalmente, está contemplado o internamento hospitalar”.  

O neurologista refere ainda a existência de medicamentos que atuam de forma a melhorar o enjoo e a sensação de vertigem, mas que devem ser utilizados pelo menor período de tempo possível. “O tratamento sintomático da vertigem está contemplado para quando os sintomas são incapacitantes, mas deve ser curto, de apenas alguns dias”, conclui João Lemos. 

TEXTO: Marta Carreiro, Esfera das Ideias